Pode-se acusar o diretor Roman Polanski de muitas coisas (muitas mesmo), mas não de ser alguém que se deixa influenciar por modas passageiras ou pelo zeitgeist vigente. Prova disso é seu mais novo filme, O Escritor Fantasma (ou The Ghost Writer, no original), que respira um filme clássico com um flerte no noir, mas que acaba prometendo mais do que entregando.
No filme, Ewan McGregor é o escritor fantasma do título, um escritor que ganha a vida escrevendo livros que não levam seu nome como autor, notadamente, biografias. A autoria do livro geralmente é atribuída a própria pessoa retratada. Logo no começo do filme, já recebemos uma boa ideia do que se trata a trama: o escritor fantasma da biografia de Adam Lang (Pierce Brosnan), ex-primeiro ministro britânico, morre num acidente em circunstâncias estranhas. Para substituí-lo, entra o escritor de McGregor. Para fazer o trabalho, ele acaba convivendo com Lang e sua esposa Ruth (Olivia Williams), juntamente com sua equipe, liderada pela assistente Amelia Bly (Kim Cattrall), enquanto o ex-primeiro ministro enfrenta graves acusações. Neste convívio, o escritor irá conhecer melhor os personagens desta peça, enquanto ele mesmo acaba se tornando uma das peças na engrenagem.
Pode-se dividir O Escritor Fantasma em duas partes. A primeira não envolve o mistério propriamente dito. Nesta parte o que temos é o desenvolvimento dos personagens de Brosnan, Cattrall e sobretudo, Williams. E, conforme o escritor vai se envolvendo com eles (e, por conseguinte, nós espectadores também), ele vai deixando de lado seu papel de mero espectador e relator (como quando ele escreve uma nota/discurso que depois ele vê no jornal, suas próprias palavras), e tomando parte da história, sem entretanto, nunca deixar de ser o escritor fantasma (que, para enfatizar tal fato, nunca tem o nome revelado).
Mesmo que esta parte envolva mais drama do que mistério, o diretor Romanski investe num clima de mistério, usando uma fotografia cinzenta, locações extensas e desertas, e sobretudo, a música antecipando algo ainda por vir.
E então, lá pelo meio do filme, enfim começa realmente a trama de mistérios, envolvendo a morte do escritor fantasma antecessor de McGregor, bem como desdobramentos que podem (ou não) ter a ver com as acusações que Lang enfrenta. Mistérios que remontam ao começo da carreira política do personagem de Brosnan, e que são grandiosos o bastante para envolver mais de um país.
Se O Escritor Fantasma tem um acerto, ele é a direção dos atores e atrizes. Ewan McGregor está (como de costume) excelente, demonstrando dúvida e apatia, como o personagem pede. Brosnan, que tem um grande lado canastrão, se dá muito bem como o ex-primeiro ministro Adam Lang, misturando charme diantes das câmeras da mídia, com rompantes atrás dela. Olivia Williams, linda mesmo envelhecida para o papel, também está excelente. E Cattrall, mais conhecida pela sua perua em Sex and the City, está quase irreconhecível como a secretária executiva de Lang.
Entretanto, se O Escritor Fantasma tem um erro, ele é a construção da tensão em torno do mistério principal do filme, envolvendo o livro. Apesar de já sabermos desde o início que tem algo de misterioso com o livro (o personagem de McGregor anuncia logo no início da película que "foi o livro que o matou" - se referindo o seu antecessor), a trama envolta dele demora a se tornar mais concreta, só acontecendo quando McGregor acaba encontrando algo nas coisas de seu antecessor.
E além de demorar a acontecer (e a cara de tédio de McGregor ao ler a primeira versão do manuscrito do livro pode ser uma boa analogia para o filme), a tensão é construída muito lentamente, deixando o ritmo um tanto quanto arrastado. Mesmo quando a tensão deveria crescer (como quando ele é perseguido por um carro escuro), a desconfiança e o medo de não saber ao certo seu inimigo, não convencem. Fora que alguns clichês do gênero também acabam não ajudando (como quando o carro que o persegue some, mas reaparece na última hora). Previsível, e portanto, sem impacto.
No geral, O Escritor Fantasma é um daqueles filmes, que também por seu elenco e diretor, acaba prometendo mais do que entregando. Não é ruim, mas o seu tipo de tensão e mistério, mais inspirado no noir, acaba não entrando em ressonância com o espectador atual, acostumado a mais correria. No fim, acaba sendo um pouco mais do mesmo, considerando o trabalho pregresso do diretor. Se isso é ruim ou não, cabe ao gosto de cada um. Eu, particularmente, achei que o ingresso valeu a pena, mas que não é um filme indispensável.
Trailer:
Para saber mais: crítica no Omelete e no Cinema em Cena.
Concordo em partes, o filme funcionou comigo.
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