2011-03-10

Filme: 127 Horas

A primeira vista, pode parecer um desafio condensar uma história de 127 horas em um filme de pouco mais de uma hora e meia. Entretanto, ao se conhecer a história, fica evidente que o principal desafio era justamente o contrário: como preencher o filme sem que ele se tornasse arrastado demais. Esse foi, talvez, o maior desafio de Danny Boyle, diretor de 127 Horas (ou no original, 127 Hours), adaptação de um livro homônimo, baseado em uma história real.

filme 127 horas james franco poster cartaz

Em 2003, o jovem Aron Ralston (James Franco), ao fazer uma trilha em um cânion, acabou caindo quando uma pedra se desprendeu. A pedra acabou prendendo a mão de Ralston, que ficou preso por cinco dias, até conseguir se soltar após um golpe de sorte e uma medida desesperada. O filme basicamente narra esse período em que Ralston ficou preso.

Na verdade, o filme ainda tem uma pequena introdução, que de maneira sutil e integrada à trama, serve para mostrar um pouco da personalidade de Ralston e passar algumas informações que serão relevantes mais a frente. Por exemplo, quando é mostrado Ralston saindo de sua casa e ignorando um telefonema da mãe, está uma peça-chave do enredo (e também da personalidade do rapaz): a de não ter avisado ninguém aonde ia, e de tentar ser sempre autossuficiente. Apesar disso, o jovem é retratado como alguém alegre e de bom astral, que tem uma certa obsessão por registrar a sua aventura com uma câmera, aspectos que ficam bem nítidos quando ele tem um acidente com a bicicleta (e leva na boa, dando risada) ou quando ele se encontra com duas jovens perdidas e acaba mergulhando com elas numa gruta. Mas o filme começa mesmo quando o jovem sofre o acidente, quando só então aparece um letreiro com o nome do filme: 127 Horas.

filme 127 horas james franco

Como grande parte de 127 Horas se passa num cenário restrito (o cânion) em termos de movimento e possibilidades de posições de câmera, Boyle usa de ângulos inusitados no decorrer da história, mostrando, por exemplo, a garrafa de água vista de dentro, como se a câmera estivesse no fundo dela, ou então como se a câmera estivesse na ponta de um canudo de um recipiente de água (que mais tarde é preenchido com outros fluidos). São ângulos interessantes, mas às vezes o diretor exagera, prejudicando a fluidez da narrativa, como com a vista de dentro da câmera de Ralston, quando ele rebobina suas filmagens para rever algo.

Outro recurso que o diretor usa bastante são os delírios do personagem a partir de um certo ponto, decorrentes da fadiga, falta de água/alimentação e da solidão, de certo modo. Alguns são bem usados, como quando Ralston emula um talk show com ele entrevistando a si mesmo, numa cena clara em que o intuito é passar algumas informações à platéia. Outros delírios são menos interessantes, como o fantasma do Scooby-doo, que insinua uma paranoia no personagem, mas que logo se perde. O mesmo pode ser dito dos flashbacks que mostram alguns momentos interessantes (como quando o pai o leva para ver o nascer do sol), enquanto outros momentos não são tão bons assim (como quando mostra ele filmando a irmã tocando piano).

filme 127 horas james franco

Entretanto, o melhor mesmo de 127 Horas são as cenas em que Ralston é mostrado ali, preso no cânion com a mão esmagada sob a pedra. Usando e abusando de câmera na mão, com muitas inserções com o ponto de vista do personagem (quando a câmera mostra o que o personagem está vendo), e com uma imagem saturada, o filme toma ares de documental. Mas o que realmente se sobressai nestes momentos é a atuação de James Franco. O ator consegue passar do otimismo para o desespero, do bom humor para o medo, de forma magistral. Aliado a uma boa maquiagem, é claramente visível o quanto o personagem de Franco vai se desgastando, perdendo aos poucos a esperança, recuperando-a por breves momentos só para vê-la ir embora de novo.

O som é um elemento importantíssimo para se criar um determinado clima em um filme. Em 127 Horas, em diversos momentos, o que temos é na verdade o silêncio. Enfatizando a natureza deserta do local e a solidão do personagem, o silêncio aparece entre momentos da trilha instrumental. Em alguns momentos a passagem da música para o silêncio é perfeita, mas em outros, deixa a desejar, como por exemplo quando a câmera (auxiliada por CGI) faz um gigantesco zoom out começando do rosto do personagem até mostrar a imensidão do cânion. Neste instante, a música sobe depois de uns instantes de silêncio, o que na minha opinião acaba por fazer com que a cena perca um pouco de sua força (mas apenas um pouco, já que o travelling da câmera é por si só, magnífico).

filme 127 horas james franco

Apesar da história incrível de superação individual, 127 Horas falha em dois pontos. O primeiro é a insistência de Danny Boyle em se desviar do condutor principal (Ralston preso) em muitos flashbacks e delírios. Depois de um certo ponto, torna-se cansativo e pouco acrescenta na história ou no clima. O segundo ponto, e talvez esse seja mais pessoal, é que o filme é mais um retrato da persistência, de um instinto de sobrevivência, do que uma busca por algo mais nobre. E mesmo que o filme tente ficar bastante sentimental no final, ele acaba não conseguindo penetrar mais a fundo, levando a apenas sentimentos superficiais. Se há uma lição no filme, ela é: sempre avise alguém (de preferência sua mãe) de onde está indo viajar.

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Enfim, 127 Horas é um bom filme e eu gostei dele. Entretanto, não acho que seja tão bom assim pra figurar entre os 10 melhores do ano. Apesar de bem feito, a impressão final é que o diretor Danny Boyle, cujo trabalho geralmente eu gosto, neste filme ficou um pouco perdido. Só assim pra explicar as sequências iniciais e finais, que mostram multidões de pessoas em metrôs, na cidade, etc. São cenas que permitem várias interpretações, mas que não encontram eco no desenvolvimento do filme. De qualquer maneira, vale a pena ver como 127 horas ficaram em 94 minutos.

Trailer:



Para saber mais: crítica no Omelete, no Cinema em Cena e (se você já viu o filme, porque está cheio de spoilers), no Crítica (non)sense da 7a Arte.

P.S. Talvez seja impressão minha, mas a música inicial do filme não tem um quê de indiana? Será influência ainda de Quem Quer ser um Milionário?

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