2011-10-06

Filme: Elvis e Madona

À primeira vista, um encontro entre o rei do rock Elvis e a (talvez ex-) rainha do pop Madonna pareceria inusitado. Mas, pensando melhor, os dois até que teriam muitas coisas em comum, fazendo o encontro menos estranho do que a primeira vista soa. Pois bem, isso se aplica também aos personagens homônimos nesta produção brasileira, Elvis e Madona. Aqui, o encontro não é musical, mas amoroso. E também soa inusitado a primeira vista, mas se torna até natural no decorrer do filme. Isso, no entanto, não redime o filme pelos seus defeitos, que não o tornam ruim, mas o tornam muito inferior ao que poderia ter sido.

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Elvis (Simone Spoladore), nascido Elvira, é uma fotógrafa lésbica que trabalha como motogirl entregando pizzas, enquanto não consegue se manter apenas com a fotografia. Madona (Igor Cotrim), nascido Adailton (mas mamãe o chamava de Dadá), é um travesti que trabalha num salão de belezas e faz pequenos shows de drag queen, esperando realizar o sonho de montar uma produção exclusiva sua. Logo em sua primeira entrega de pizza, Elvis se depara com Madona no chão, chorando. Ela acabara de apanhar de João Tripé (Sérgio Bezerra), o bandido da história e antigo caso amoroso da moça (ou moço, tanto faz), que ainda por cima, roubou o dinheiro que Madona estava juntando para financiar o seu tão sonhado show. A partir daí, seguindo a cartilha da comédia romântica convencional, Elvis se aproxima cada vez mais de Madona, eles se apaixonam, ficam juntos e enfrentam vários problemas que ameaçam separar o casal. Realmente fica difícil falar de qualquer comédia romântica sem sentir que estou dando um grande spoiler (e este é o meu segundo texto sobre comédias românticas hoje), mas que culpa tenho eu se a estrutura é sempre a mesma?

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Sim, porque Elvis e Madona no fundo, é uma comédia romântica. Que tem como seus protagonistas personagens inusitados, mas que no fundo, formam um casal como qualquer outro. Inclusive, sendo um mulher e um homem. Se bem que no caso deles, o homem é "a fêmea" e a mulher é "o macho". Nada demais até aí, viva a diversidade! O grande problema do filme é que apesar de ser estruturalmente uma comédia romântica, o filme é meio indeciso (!) quanto a sua orientação de gênero (!). Ele flerta diversas vezes com o drama, criando uma certa expectativa, mas o resultado são dramas rasos e que poderiam nem estar ali (preferencialmente, não deveriam estar ali). Veja, como exemplo, o drama da família de Elvis. O roteiro cria uma imensa expectativa, com os telefonemas da mãe de Elvis (Maitê Proença, numa ponta especial) e o drama familiar é praticamente resolvido em uma cena em que a mãe de Elvis dá um piti e pronto.

Elvis e Madona poderia ter rendido um grande drama, mas preferiu não se aprofundar em alguns temas mais pesados, como por exemplo, a discriminação/preconceito por causa da sexualidade dos protagonistas. Tudo bem, foi uma opção válida do diretor e roteirista Marcelo Laffitte. O problema são as pequenas incursões do roteiro justamente em temas mais pesados, que acabam sendo mal colocados ou tratados levianamente. Um exemplo é quando Madona sobe no palco para apresentar seu show e um rapaz ali pela boate diz algo como "sai daí, viado". Ora, uns planos imediatamente anteriores já deixavam claro que a boate era reduto GLBT (ou LGBT ou qualquer outra combinação da ordem das letrinhas), ou seja, frequentada por homossexuais (o "ursão" seminu andando pela boate deveria deixar isso bem claro pra qualquer um). Se alguém vai xingar algum homossexual, é de se esperar que não o faça num lugar como esse (a não ser que a pessoa seja demente). Outro exemplo, de algo tratado levianamente, é a história do João Tripé vendendo drogas e depois aparecendo solto. Quando ele ameaça Madona por telefone e esta sai atrás de Elvis como louca, é de se esperar alguma consequência mais nefasta. Que não aparece.

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Além de ter errado a mão na parte dramática (talvez até por receio de mexer em temas tão delicados, o que é compreensível, mas não perdoável para o filme), o diretor Laffitte também encontra dificuldade no timing da comédia. Os personagens auxiliares dos protagonistas (no caso de Elvis, o pessoal da pizzaria onde trabalha, e no caso de Madona, as companheiras do salão de beleza) até tentam exercer o papel cômico destinado a eles, mas não são todas as piadas que se encaixam. Em muitos casos, você até percebe a intenção de fazer piada num diálogo, mas a graça não vem. Veja, por exemplo, a primeira cena passada no salão, quando uma personagem menciona o seu namorado Pachecão e a cliente na cadeira confunde esse Pachecão com uma outra travesti que colocara silicone na bunda. O diálogo é claramente construído para ser engraçado, mas tanto o contexto (as meninas acabaram de descobrir que Madona fora roubada e esmurrada) quanto o desenrolar da cena acabam com qualquer lado cômico. Outro exemplo é quando Elvis está fazendo um trabalho freelancer (freela, para os íntimos) fotografando o book de uma garotinha. O diálogo da mãe é claramente cômico, mas como a cena se torna séria (com Elvis fotografando João negociando drogas ao fundo), as piadas no texto não funcionam.

Entretanto, Elvis e Madona também tem seus bons momentos cômicos, a maioria liderada pelo jeito espalhafatoso/afetado de Madona e de sua (ou seu, whatever) fiel escudeiro(a) Bill (Wendell Bendelack). A dupla de viados (como elas mesmas se denominam), tem um ótimo astral e diálogos afinados, o que se traduz em boas risadas (o que é fundamental numa comédia romântica, certo?).

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Aliás, o ponto forte de Elvis e Madona sem dúvida é a atuação de Igor Cotrim. Sua Madona é verossímil ao mesmo tempo que fabulesca (provavelmente, devido a natureza do estereótipo alegre que acompanha diversas travestis do show biz). Reparem, por exemplo, quando Madona "se disfarça" de Adailton para conhecer a família de Elvis. Os trejeitos, as poses, tudo, é como se lá houvesse uma mulher (com a alma de uma, num corpo de homem). É de fato uma atuação tão boa, que até mesmo a estranheza inicial que a figura de Madona nos transmite (afinal, não é a coisa mais padrão do mundo uma mulher alta e com bíceps maiores que o seu), se desfaz com algumas cenas de Cotrim, e passamos realmente a acreditar que vemos uma personagem feminina.

Infelizmente, apesar de eu ser fã da Simone Spoladore, a atuação dela não se encontra no mesmo nível. Talvez culpa da caracterização pedida pelo diretor, talvez não, mas o fato é que enquanto Madona é verossímil, Elvis, pelo menos na primeira metade do filme, é exagerado. Demais. Over, como diriam alguns. Por exemplo, o gesto dele, de dar uma espécie de mini soco no ar quando fica feliz por ter conseguido algo com Madona, por exemplo, é acompanhado por um efeito sonoro característico. O resultado fica parecendo de desenho animado e definitivamente, não contribui para a caracterização da personagem. Há ainda o tique de Elvis de jogar o cabelo para trás (como se o Elvis do rock alisasse sua cabeleira de brilhantina), especialmente quando está "na caça" (de olho em alguma fêmea). Esse gesto é repetido tanto, à exaustão, que cansa. (Se bem que o gesto em si não deixa de ser interessante, visto que Elvis procura se masculinizar toda, seja no jeito, na voz, na postura e nas roupas, e o gesto de passar a mão no cabelo demonstrando interesse sexual é algo tipicamente feminino, ainda que esteja masculinizado pela teórica passada de mão no topete "Elvis Presley".) Porém, se Spoladore é prejudicada pelos trejeitos de Elvis, ela ainda consegue mostrar que é uma grande atriz em pequeninos gestos, como virar o rosto e olhar para baixo ao revelar o seu nome de nascença Elvira, demonstrando desprezo, ou então no jeito como ela olha para Madona depois de se declarar apaixonada.

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Elvis e Madona tem um clima meio "fabulesco", como um conto de fadas moderno. Isso é notado não só pelos personagens principais, que são bem exagerados, como em certos momentos que transbordam um toque de surreal. Só assim para explicar, por exemplo, a cena em que Elvis aparece como uma anja (na boate, ao bater fotos, jogando o flash para cima da câmeram que assume o ponto de vista de Madona, vemos asas de anjo atrás de Elvis, que na verdade pertencem à garçonete atrás dela). Outro momento que fica claro o clima irreal é no final, onde o show deve continuar, mesmo depois do clímax mostrado (SPOILER ATÉ O FINAL DO PARÁGRAFO: sim, o show de Madona prossegue, mesmo depois do Pachecão matar o João Tripé na fileira principal do teatro; dane-se que tem um morto ali, o que importa é a fila de gente querendo entrar no teatro... FIM DO SPOILER).

Apesar das falhas, Elvis e Madona têm também bons acertos. Os stablishing shots (planos que servem de transição, para mostrar onde a ação se passa, ou como o tempo passou), como fotos de Elvis, são um toque criativo e bacana. A direção de arte também é boa, especialmente nos detalhes das decorações dos apartamentos dos protagonistas. Reparem como o de Madona é rosa, vivo, cheio de enfeites e decorações, enquanto o de Elvis é cinza, meio escuro e simples, quase sem adereços decorativos, o que expressa muito bem a personalidade de cada um. As músicas e suas letras também são uma extensão da narrativa, e apesar de eu não apreciar os gêneros musicais que tocam no filme, elas cumprem bem a sua função.

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Apesar do bairrismo exagerado pelo bairro onde se passa o filme, (Oh, Copacabana é o mundo, tudo acontece em Copacabana primeiro, Elvis e Madona só poderiam ter se encontrado em Copacabana, etc), é uma história que poderia ter se passado em qualquer outra grande cidade. Considerando-se, claro, que fosse algo tão fantasioso quanto a Copacabana do filme.

Enfim, Elvis e Madona é uma comédia romântica em clima de conto de fada, ou seja, algo irreal. E o diretor não tem vergonha disso, aliás, assume isso como parte integrante do filme, ao iniciá-lo e terminá-lo com claquetes abrindo e fechando a película. Apesar desse lado de fábula, o filme flerta bastante com dramas bastante pé-no-chão. E essa indecisão atrapalha bastante o desenvolvimento do filme, mas não chega a estragá-lo. Porque mesmo que estejam longe de serem perfeitos, os personagens principais são cativantes e valem a pena serem conhecidos.

Trailer:



Para saber mais: crítica no Omelete e página oficial do filme Elvis e Madona.

P.S. Como eu não poderia gostar de um filme que tem a Simone Spoladore de cabelos curtos e que, ainda por cima, tem cenas mostrando os lindos seios dela? Sim, temos cenas de sexo entre Elvis e Madona, nada pornográfico (apesar de Madona ser conhecida desse meio), mas bem interessante, com peitos de sobra (se bem que eu só gosto mesmo de um par deles)...

6 comentários:

  1. q estranho essa ideia de lesbica se apaixonar por gay.. muuuito estranho...

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  2. Cara, eu não etrminei de ler o post por q tem muitas revelações do enredo e eu quero muito ver esse filme

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  3. Cara, eu não etrminei de ler o post por q tem muitas revelações do enredo e eu quero muito ver esse filme

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  4. Faz bem, eu recomendo que veja sempre os filmes antes de ler qualquer crítica ou resenha. No máximo, leia a sinopse.

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  5. ufa, chegou aos cinemas...

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  6. Maravilhoso, realmente gostei muito. É uma história curiosa, considerando os tempos, este estreante fita de Marcelo Laffitte poderia ser enquadrada mais como uma comédia romântica do que drama. Fiquei surpreso ao ver no elenco Simone Spoladore que está estrelando uma série altamente controversa chamada Magnífica 70, finalmente, voltar para o elenco deve dizer foram chave para o sucesso deste filme. Elvis & Madona é uma grata surpresa e faz jus aos prêmios que tem recebido. Conta uma boa história de amor possível (com seus percalços) e é ousado, abusado e angraçado. Não subestima a inteligência do espectador e muito menos provoca qualquer constrangimento sexo-sócio-cultural.

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