Em Tóquio, em 2002, pelo menos o equivalente a 23 MILHÕES de dólares em dinheiro foram encontrados, perdidos por aí. Como é que eu sei disso? Porque lá no Japão, o povo tem o costume de entregar para a polícia coisas que são achadas. E isso inclui dinheiro. E sabe o que mais? 72% desses 23 milhões foi devolvido aos seus donos.
Em uma matéria de 2004 do NY Times, intitulada: Never Lost, buf Found Daily: Japanese Honesty (traduzido seria "Nunca perdida, mas encontrada diariamente: honestidade japonesa"), é descrito o sistema que os japoneses mantém de 'achados e perdidos', em escala maior que as iniciativas locais que temos aqui no Brasil, como por exemplo, dentro apenas de determinados estabelecimentos.
Segundo a matéria, 19% daqueles 23 milhões vão para quem achou o dinheiro, depois de passado meio ano sem que ninguém o reclamasse. Pela legislação, depois de meio ano, se o objeto encontrado não for devolvido ao dono, quem achou pode reclamar a posse. Entretanto, muitas dessas pessoas não se dão ao trabalho, e as coisas são então propriedade do governo.
Esse "sistema" de achados-e-perdidos pode ser rastreado até um código escrito no ano de 718, de acordo com Hideo Fukunaga, um ex-policial que escreveu um livro sobre o tema. Na época, vários objetos, animais e até servos tinham que ser entregues a um oficial do governo em até 5 dias a partir da data em que foram encontrados. Depois de um ano, o governo tomava posse dos pertences, apesar do dono ainda poder reclamá-los.
Se por aqui tal atitude é quase impensável (se você contar pra alguém que devolveu alguma coisa, até chamado de mané, tonto, vai ser), no Japão a coisa é bem diferente. Em Tóquio, um grande armazém guarda os achados em quatro andares cheios de coisas catalogadas de acordo com o local e data em que foram encontradas.
Os itens que mais são devolvidos são os celulares. Muitas vezes os donos ligam para o próprio celular, e descobrem o paradeiro do aparelho. Ou então são rastreados pela assinatura da operadora.
Entretanto, o item que mais se vê são guarda-chuvas. Um verdadeiro mar de guarda-chuvas, com 330 mil, só em 2002. E a taxa de retorno dos guarda-chuvas é baixo, cerca de 0,3%, o que segundo a matéria, mostra como a economia tem prosperado - antigamente, diz Hitoshi Shitara, "uma pessoa mal tinha um guarda-chuva, ou uma família dividia um. Então, se você perdesse um guarda-chuva, seu pai te dava uma bronca".
O Sr. Shitara é um oficial veterano em um dos centros de achados-e-perdidos. Por ele, já passaram desde óculos de sol, até mesmo cadeiras de rodas. Talvez John Locke (o perdido, não o filósofo) explique =P.
Essa 'cultura' da honestidade definitivamente não existe aqui no Brasil. Aqui, o que vale é "ser esperto", a lei de Gerson. A cultura aqui te exige isso. Senão você é otário, burro, idiota... E ninguém gosta de ser otário.
Eu lembro que uma vez, no primário eu acho, achei sei lá, uns equivalentes a 20 reais. Era dia de excursão, e o preço era exatamente os 20 reais, então eu sabia que era alguém que ia (eu não ia). Ninguém mais viu o dinheiro ali no chão, e também ninguem viu eu pegando o dinheiro.
O que eu fiz? Entreguei pra professora. Mas não contei isso pra mais ninguém, até hoje. Isso porque eu não queria ninguém me chamando de trouxa. Hoje eu não ligo mais, porque se encontro um trouxa me chamando de trouxa, meto a mão na cara do infeliz. Entende a situação? Aqui, você não tem orgulho de dizer que é honesto.
Ao contrário de lá. Veja por exemplo, a Hitomi Sasaki, na reportagem, que havia achado cerca de 250 dólares no restaurante em que trabalha. Na ocasião da reportagem, ela estava num centro de achados-e-perdidos para reclamar o dinheiro, depois de seis meses: "Eu sempre entrego algo que eu encontre, como bolsas por exemplo. Eu imagino que a pessoa possa estar com problemas, perdendo o dinheiro ou a bolsa".
Outro exemplo: Tsutomu Hirahaya, em Junho de 2003 havia achado cerca de 120 dólares. Entregou o dinheiro, e em algumas semanas antes da reportagem ser publicada, em Janeiro de 2004, recebeu uma carta da polícia informando que o dinheiro era dele agora. Ele diz: "Eu me sinto desconfortável segurando o dinheiro de outra pessoa. Eu acho que muitos japoneses se sentem da mesma maneira, e entregam as autoridades o que acham. Eu acho que entre os japoneses ainda há um senso de comunidade, desde antigamente".
As imagens ao longo do texto acima são screenshots do comecinho do Dorama (espécie de mini-série japonesa, uma espécie de novela) Liar Game. Elas mostram a protagonista da série, devolvendo uma moeda de 100 ienes na polícia. Claro que isso é uma piada, faz parte da construção da personagem (uma pessoa super honesta), já que 100 ienes não deve dar nem 2 reais, com o dólar baixo desses dias. Pra se ter uma idéia, as nossas lojas de 1,99, têm o equivalente lá no Japão, nas lojas de 100 ienes.
Dê uma olhada na sequência neste vídeo:
Lendo a matéria do NY Times, eu lembrei dessa cena inicial de Liar Game (traduzindo, seria jogo da mentira ou do mentiroso), e por isso resolvi fazer este post (que tá enorme).
Eu ainda não assisti todos os episódios de Liar Game (link para o site oficial), mas tô gostando muito. Estou acompanhando pelos lançamentos do fansub JDrama, de onde retirei a descrição: "Baseado em um manga do mesmo nome, a nova atriz Toda Erika, de 19 aninhos, dá mais um show de interpretação. Desta vez, ela faz um papel totalmente contrário o de Hana Yori Dango, interpretando uma mulher honesta e justa além do dinheiro e das ganâncias humanas. Contudo, uma organização secreta a envolve em um jogo chamado Liar Game, onde mentir e obter dinheiro são os principais objetivos. Neste meio tempo, um sagishi (golpista) está sendo solto da prisão e se envolve no jogo de forma estranha. Será que o dinheiro realmente é tudo no mundo? Pode existir humanos além da ganância de nossa sociedade e buscar a honestidade e a justiça acima de tudo? Descubra em mais este super dorama de interpretações convincentes e enredo que te prenderá até o final.
Interessante, não?
Se quiser ler a sinopse dessa série, pega do wiki do D-Addicts (mas que contém um leve SPOILER do primeiro capítulo): "Nao Kanzaki é uma estudante colegial honesta, que recebe 100 milhões de ienes (~ 1 milhão de dólares) um dia, com uma carta dizendo que ela fora selecionada para participar do "Liar Game". O objetivo do jogo é enganar os outros jogadores e convencê-los a dar os 100 milhões deles. No final, o vencedor ganha 100 milhões, e o perdedor fica devendo 100 milhões. No dia seguinte, ela recebe uma notificação dizendo que o oponente dela é o ex-professor Kazuo Fujisawa. Ela vai até ele, procurando ajuda, mas acaba sendo enganada, e entrega a ele o dinheiro. Desesperada, ela procura ajuda da polícia, mas eles não podem fazer nada. Entretanto, ela fica sabendo que um mestre dos golpes, Shinichi Akiyama, está sendo solto no dia seguinte. Desesperada, ela vai atrás dele, buscando ajuda."
P.S. Vi o link pra matéria do Times no Kirainet, só que o link agora não tá funcionando. Se quiser conferir, clica aqui: http://www.kirainet.com/english/23-million-in-cash/
Um comentário:
eu non acredito!!! eu tinha comentado aki nesse blog la da casa do guto.. mas non apareceu nada aki.. ara..
quais as chances da sua professora ter ficado com o dinheiro que vc devolveu? XD
nunca achei nada na rua.. so moedinha.. e uma vez que o entregador da marmita quis me dar 50 reais de troco...
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