Tenso. É assim que passei boa parte da projeção de A Perseguição (no original, The Grey). Com uma história simples, mas que prende a atenção, o filme dirigido por Joe Carnahan tem os elementos de um bom filme de suspense/sobrevivência: personagens carismáticos que conseguem nos fazer torcer por eles; uma ameaça sempre presente e que pode atacar a qualquer momento; fugas e, claro, perseguições.
A história básica do filme é simples e pode ser resumida em um parágrafo pequeno: um grupo de trabalhadores de uma indústria petrolífera estão voltando do Alasca, quando o avião deles cai. O grupo de sobreviventes dessa queda se vê ameaçado não apenas pelo ambiente inóspito de frio e tempestades, mas também de uma matilha de ferozes lobos (da espécie de lobos cinza - gray wolves - que dá o nome original do filme, apesar de nem todos os lobos serem efetivamente cinzas), que perseguem o grupo por eles estarem dentro de seu território.
A Perseguição é visualmente bem feito. As cenas com neve caindo, uma constante no filme, se parecem muito verdadeiras, é porque são: a equipe filmou em condições bem adversas, segundo uma entrevista de Liam Neeson, o protagonista do filme. Outro exemplo é a cena da queda do avião, visualmente muito bacana e que não perde em nada para a queda de avião de Lost, por exemplo. Aliás, não só a queda do avião lembra Lost, como também uma boa parte do desenvolvimento de Ottway, personagem de Liam Neeson. Assim como os personagens de Lost com seus flashbacks, Ottway é atormentado pelo passado. Um passado que só entenderemos plenamente no final do filme, e que encerra um desenvolvimento que os personagens começam a ter mais profundamente da segunda metade em diante do filme, com discussões filosóficas sobre a existência de Deus e a crueldade, ou melhor dizendo, imparcialidade da natureza e do destino.
Spoilers neste parágrafo. Se você não viu o filme, pule para o próximo. Toda a construção do personagem de Neeson é excelente. No começo do filme é apresentado o personagem como uma pessoa sem esperança (na cena em que ele quase se suicida). Depois disso, mesmo lutando pela sobrevivência, enfrentando os lobos, ele o faz não por querer viver, por ter algo pelo que lutar (coisa que ele incita seus companheiros a fazer, em um diálogo na fogueira com os outros sobreviventes, ao dizer que se eles tivessem algo a que se apegar, algo que quisessem não no fim da vida, mas logo adiante, lutassem por isso, pois lutariam mais fortes). Como já ouvimos o personagem dizer, o que ele gostaria, não pode ter, pois a sua amada se fora para sempre (no sentido mais literal possível). Mas ao mesmo tempo ficamos sabendo da história de seu pai e seu poema, que não o deixava fugir da batalha, num lance de alma de guerreiro. E aí temos a bela construção do personagem, que mesmo desesperançado, luta sua última batalha (do poema: "Na última boa luta que eu jamais conhecerei, Morra e viva neste dia" - Into the last good fight I'll ever know, Live and die on this day). Entretanto, o que eu mais gostei mesmo foi que o personagem no final não tem uma revelação, não alcança um êxtase. Ele segue coerente, tendo como guia não uma divindade, mas a certeza dos rumos da natureza: da natureza do animal lobo, "do frio" que sente, etc. E a minha cena preferida do filme ilustra isso: desesperado, ao ver o último companheiro sobrevivente da queda, morto afogado, ele grita aos céus pedindo ajuda, que se houvesse um Deus, ele precisava de uma prova naquele momento. Diante do silêncio, com apenas o barulho do rio, ele diz algo como "Foda-se. Eu mesmo vou resolver isso". E segue adiante, até o final, que é deixado em aberto. Fim dos spoilers.
A Perseguição mantém um clima muito tenso na sua primeira metade. Muito tenso mesmo, com os lobos atacando quando se menos espera, e sempre sem mostrar muito dos lobos (uma lição que filmes como Tubarão, de Spielberg, e Seven, de Fincher, nos ensinam muito bem). A segunda metade do filme acalma um pouco a tensão, dando espaço para o desenvolvimento dos personagens, o que é bem vindo, já que uma tensão forte como a da primeira metade no filme todo poderia bem elevar alguns riscos cardíacos.
Com roteiro do próprio Joe Carnahan (o diretor) e de Ian Mackenzie Jeffers (autor do conto que inspirou o filme), A Perseguição é um filme tenso, adulto, e que como a vida, não te dá respostas finais (a não ser uma que é óbvia e que eu mesmo te dou agora: um dia, você vai morrer, como todos os outros). O filme também prova que o Carnahan não sabe só fazer galhofas (como seu filme anterior, o remake do clássico oitentista Esqudrão Classe A, também com Neeson). É, enfim, uma boa surpresa.
Trailer:
Para saber mais: crítica no Omelete.
P.S. Tem cena extra no final dos créditos.
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