Terrence Malick é um diretor que provoca reações extremas. Ou você ama os seus filmes ou os odeia. Já deixo claro que sou uma pessoa do segundo time. Por sorte (ou azar), Malick produz seus filmes com longos intervalos de tempo entre cada um. O último é este A Árvore da Vida (ou The Tree of Life, no original), filme que tem maravilhado muitos críticos e provocado reações intensas no público. Reações estas que variam de um sono incontrolável a um deslumbramento total (particularmente, me encontro no meio termo).
Sucintamente, a história de A Árvore da Vida gira em torno das lembranças da infância de Jack O'Brien (vivido por Sean Penn quando adulto e por Hunter McCracken quando criança), vivendo numa cidade do interior, crescendo ao lado de seus dois irmãos mais novos e de seu rígido pai (Brad Pitt) e de sua adorada mãe (Jessica Chastain). Nessas lembranças, acompanhamos junto do personagem as brincadeiras com os irmãos, a descoberta do mundo, mas especialmente, como a figura paterna o influenciou (e isso é bem visível numa cena em que o jovem rapaz imita o jeito peculiar de seu pai andando com as mãos no bolso, e esse jeito de andar se torna constante depois para ele, ao longo do filme).
No trailer (não me recordo se isso se manteve no filme), o personagem diz, para si mesmo, mas direcionado aos pais, que eles (os pais) sempre irão estar dentro dele lutando. Num primeiro nível, isso se deve ao estereótipo (que condiz com a época), de como deveria ser a educação: o pai sendo rígido e a mãe sendo carinhosa. De forma mais profunda, entretanto, Malick pretende que essa dualidade seja um símbolo dos dois caminhos que um homem, segundo o filme, pode trilhar. Esses dois caminhos são logo enunciados na abertura do filme, e são o da natureza e da graça. O primeiro se referiria ao mundo da natureza, selvagem, que dá sempre o troco e que pode se relacionar como o pai vê a educação dos filhos (prepará-los para enfrentar a vida dura "como homens"). O segundo caminho seria o da iluminação, de existência de algo divino, e que pode se relacionar com a visão da mãe, sempre carinhosa e amável.
O problema de A Árvore da Vida é o prolixidade de Malick. Para ilustrar a grandiosidade do mundo, do universo e tudo o mais em face ao minúsculo ser humano, ele gasta muito tempo recapitulando a história do universo até o momento em que o filme se passa. Começando com imagens confusas, que poderiam muito bem representar o caos (ou o que quer que seja, antes da aparente ordem que é o universo), o diretor passeia pelo Big Bang, pela formação das estrelas, do nosso sol, dos planetas e da nossa Terra. Já com o nosso planetinha criado, ainda passamos pelas visões de uma Terra jovem e hostil, até esfriar e começar a surgir vida, onde vemos a vida primitiva evoluindo, mostrando passos significativos (como a saída de animais da água para o meio terrestre), evoluindo para formas mais avançadas como dinossauros e ufa!, chegando aos tempos humanos. Se você se cansou de ler esse parágrafo, tem uma ideia de como é essa parte do filme, que deve consumir boa parte do primeiro terço dele.
Claro, como todo prolixo bom, Malick sabe enfeitar a sua narrativa. E as imagens de toda essa epopéia são espetacularmente geradas por animações digitais, aliadas a músicas edificantes e grandiosas, com um toque de clássico. É inegável que são animações belíssimas emolduradas por músicas tocantes, mas é só. A função simbólica para o filme poderia muitíssimo bem ser alcançada por metade do que é mostrado. E pensar que certas notícias dizem que os 139 minutos de projeção do filme eram originalmente mais de 4 horas, me causa arrepios (ou bocejos de sono).
Outro problema de A Árvore da Vida é a quantidade de símbolos que Malick insere na narrativa. Particularmente, tenho a opinião de que um autor, de qualquer mídia ou gênero, é muito bem vindo ao inserir simbolismos em sua obra. Mas quando a quantidade desses símbolos é muito grande, a obra se torna apenas presunçosa (e em muitos casos, preguiçosa, ao jogar símbolos que de tantos e tão genéricos, podem ser qualquer coisa). E na minha opinião, pior ainda quando os símbolos não estão inseridos organicamente na obra, mas esfregados na cara do espectador. A Árvore da Vida sofre desse mal, ao mostrar, entre cenas da história com os personagens, planos sem função definida na história, geralmente imagens grandiosas, como uma cachoeira vista do alto ou outra paisagem natural.
Quando o diretor e roteirista abandona essas imagens grandiosas e se concentra nas lembranças de Jack, o filme ganha muito. O texto é ótimo, refletindo muito bem as personalidades do pai, da mãe e de Jack, bem como a época em que o filme se passa. E se o texto soa tão bom, é só porque a atuação dos atores está excelente. Brad Pitt e a relativamente desconhecida Jessica Chastain entregam atuações complexas e excelentes. Surpreendente também é Hunter McCracken, que impressiona como o jovem Jack. Uma pena é a participação de Sean Penn, que é mal aproveitado e quase sem falas, apesar de mesmo assim, conseguir passar alguma emoção apenas através de suas expressões.
A Árvore da Vida não é um filme para todos, daqueles de sessão-pipoca. Isso é bem claro, apesar da quantidade de salas que o exibiram. Seu ritmo é lento, prejudicado ainda mais pela profusão de imagens (simbólicas ou não). Seu roteiro não tem uma história bem definida, assim como certas fases da vida não têm uma. São fragmentos e recordações, que não se juntam para formar um todo e obter um significado maior (coisa que, em termos de histórias de pré-adolescentes e crianças, Stephen King domina como ninguém, mesmo em seus livros de terror). Mesmo assim, a parte que se foca nas lembranças de Jack, e especialmente onde seu pai aparece, são ótimas. O que estraga mesmo é a insistência de Malick em contrapor esses momentos com demasiadas imagens simbólicas. (Sério, um mesmo plano mais no final do filme, em que a mãe de Jack abre os braços, meio que comungando com a natureza, é repetida mais de quatro vezes - eu parei de contar na quarta vez. E nem todas as vezes a repetição é de um ângulo diferente. Prolixidade em imagens em movimento.)
Enfim, se A Árvore da Vida não é tão bom assim, também não é tão ruim, tendo bons pontos, como mencionei acima, especialmente na atuação de Pitt, Chastain e do jovem McCracken. Então, por que o detestei? Porque eu sinto que o filme poderia ter sido muito superior, com potencial pra ser um daqueles filmes que a gente leva pra vida. Claro, isso é pessoal, uma vez que as situações mostradas de Jack com o pai linha dura e a mãe carinhosa se refletiram muito na minha própria história (cenas inteiras eu vivi quando criança de forma que eu parecia estar naquele "momento de morte e revendo a vida passar diante dos olhos", com as devidas adaptações de época/local). No final, o que sobrou da árvore foi uma grande frustração.
Trailer:
Para saber mais: críticas mais positivas no Cinema em Cena e no Omelete.
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