Existe um grupo de filmes que não deve ser levado a sério. E mesmo assim, ou talvez por isso, sejam até divertidos, mas totalmente descartáveis. Esse é o caso de O Turista (ou The Tourist, no original). Vendido como um suspense de espionagem e ação, o filme se dá bem mesmo na parte cômica.
A história de O Turista começa em Paris, onde acompanhamos uma vigia da polícia local e Interpol sobre Elise Ward, interpretada por Angelina Jolie. Apesar dela não ter cometido nenhum crime, ela é o elo de ligação para encontrar Pearce, um homem que roubou bilhões de um mafioso. O problema é que ninguém sabe como Pearce se parece, pois ele mudou o rosto após milionárias cirurgias plásticas.
Tentando enganar a Interpol, Elise pega um trem com destino a Veneza, com instruções de escolher alguém aleatoriamente no trem, com a mesma altura e composição corporal de Pearce, e fazer com que seus perseguidores achem que o escolhido é Pearce. Nessa "tarefa", ela começa a conversar com Frank Tupelo (Johnny Depp), um turista americano. O problema começa quando o mafioso e vilão do filme Reginald Shaw (Steven Berkoff) também acha que Frank é o ladrão e vai atrás dele.
O Turista tem o maior jeito de filme dos anos 80/início dos 90. As primeiras cenas, com Elise escapando da vigilância dos agentes da Interpol, lembra muito os filmes de espionagem passados na Europa naquele clima de guerra fria, com a diferença do cenário ser atualizado para o que importa hoje em dia: dinheiro e finanças. Nesse sentido, Elise se porta como uma perfeita espiã, quase uma 007 de longos e chiques vestidos.
Mas o feeling de filme antigo não fica apenas nisso. O filme parece ter sido feito numa época mais inocente, em que a dicotomia entre vilões e mocinhos era clara, mesmo em se tratando de espiões. Isso se reflete no gângster Shaw, interpretado muito caricaturalmente por Berkoff. Desde a sua primeira aparição, fica claro no filme quem é o vilão da trama. Ou ainda no figurino, quando em determinado momento, depois de uma certa "evolução" do seu personagem (evolução esta, que é praticamente esfregada na cara do espectador, simbolizada pelo acendimento de um cigarro), Depp é o único a vestir um smoking branco, primeiro num plano mais aberto, mostrando-o ainda em Veneza, e depois aparecendo num ponto crucial da trama, num salão de baile.
Apesar de eu ser fã de Depp, quem toma conta da tela é Angelina Jolie. Esse ponto, entretanto, é como uma faca de dois gumes: ao mesmo tempo que sua presença é marcante, a caracterização da sua personagem fica prejudicada, afinal, o que enxergamos na tela é a imagem de femme fatale de Angelina. E isso é claramente intencional, ou o diretor Florian Henckel von Donnersmarck não enfocaria o andar rebolando de Jolie em vários momentos, como no início do filme, em que até rola uma piada entre os guardas que a vigiam, se ela está usando ou não calcinha.
Se Jolie domina as suas cenas, quem melhor desenvolve seu personagem é Depp. Sua caracterização como um cara comum, meio tímido e um tanto fracote é ótima, tanto em momentos reveladores (como quando ajuda pessoas a desembarcarem do trem) quanto nos momentos de ação (como na desajeitada fuga pelo telhado). Na verdade, uma das poucas coisas que estraga a sua atuação é o roteiro, que com a reviravolta final, faz com que tudo o que acompanhamos até o momento exija uma suspensão de crença muito grande de engolir. Aliás, em se tratando de roteiro, é visível uma vez mais como o filme tem aquela aura de inocência (ou de presumir que o espectador seja pouco sofisticado), ao usar o cigarro como símbolo da evolução do personagem, enfatizando na tela cada aparição do vício tabagístico.
Mesmo que O Turista derrape feio no final, e acabe sendo bem inferior na sua segunda metade, a primeira metade do filme é ótima. As primeiras cenas de Jolie e Depp são divertidíssimas, sobretudo nos diálogos que travam no trem, como quando Elise ensina a Frank como convidar uma mulher para jantar. Vale também mencionar um plano que eu gostei muito, que se passa no hotel, quando num momento mais romântico, é mostrado Frank e Elise em cômodos separados, mas pela janela, vemos os dois ao mesmo tempo. Aliás, em termos de cenários, é notável que o filme não tenha caído naqueles "planos de agência de turismo", mostrando grandiosamente ambas as cidades, Paris e Veneza. Infelizmente, se o filme não abusa, também não usa adequadamente os cenários, e tirando-se uma ou outra sequência em que barcos são importantes, a impressão é de que qualquer cidade poderia ser o cenário do filme.
Talvez o maior defeito de O Turista seja o de não se posicionar definitivamente em um dos gêneros que ele flerta. Não é exatamente um filme de espionagem, nem de ação, nem um romance, nem uma comédia assumida. Tem todos esses elementos, em diferentes graus e em diferentes momentos, mas no geral, ele patina entre esses gêneros. Pra mim, o que mais sobressaltou foi o lado cômico, e por isso, tenha achado o filme divertido. E ele é bem divertido, desde que se abram algumas concessões no tocante à realidade. De qualquer maneira, a realidade dos filmes quase nunca é a nossa, mesmo.
P.S. A reviravolta final é de dar reviravoltas no estômago.
Trailer:
Para saber mais: crítica no Cinema em Cena e no Omelete.
3 comentários:
incrível como desde a aparição do Deep eu achei o filme inteiro previsível demais... as cenas cômicas beiram ao pastelão rs. Enfim, o cenário e alguns diálogos salvam o ingresso. E claro, a beleza do casal. análise ótima ;-)
estou numa fase tão bestinha q só a beleza dos dois vai me levar ao cinema...
Eu adorei a postagem! E eu já vi o filme e achei ótimo! Sou uma grande, grande, grande (mesmo) fã do Johnny Depp! Ele é muito engraçado e lindo demais! Mas, eu adorei a sua postagem!
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