Uma comédia tragicômica de erros sobre amores e as dores daquela fase em que não se é um adulto, mas também já se deixou a adolescência (a fase que seria uma espécie de adolescência estendida). É essa a descrição sucinta de Frances Ha, que carrega o DNA até a última ponta dos cabelos dos filmes indie norte-americanos.
Em Frances Ha temos a história de Frances (Greta Gerwig), mulher de vinte e tantos anos que parece mal ter saído da adolescência, em termos de maturidade (e não de aparência). Ela sonha em ser bailarina em um grupo de dança e enquanto isso não acontece, vive como uma dançarina substituta, ganhando pouco. Divide o apartamento com a melhor amiga Sophie (Mickey Sumner), formando, como ela mesmo diz, um casal lésbico que não transa mais. De fato, "dividir o apartamento" é uma descrição generosa, já que quem realmente paga o aluguel é Sophie, que trabalha numa editora. Quando Sophie anuncia que vai se mudar para outro apartamento e dividí-lo com outra colega, o mundo lúdico de Frances começa a desabar e os primeiros sinais da vida adulta de verdade começam a bater a sua porta.
Frances Ha é filmado em preto e branco. Segundo o diretor Noah Baumbach, o motivo era o de dar um ar saudosista ao filme. Infelizmente, essa decisão se mostra apenas um capricho do diretor, já que a fotografia em preto e branco, apesar de ser bem bonita (pelo menos para o meu gosto pessoal), não serve à trama. E se a fotografia em preto e branco naturalmente evoca um certo saudosismo de época, isso é destruído rapidamente ao vermos personagens em um contexto mais do que contemporâneo, com seus iPhones tocando.
Co-escrito pelo diretor Baumbach e pela protagonista Greta Gerwig, a maior parte de Frances Ha me parece uma sitcom barata sobre o nada, ao estilo de Seinfeld, mas tirando toda a graça. Sim, porque as risadas provocadas pelo filme são quase em sua totalidade por vergonha alheia das situações que a protagonista passa, mas sem muito brilhantismo. Em grande parte da projeção o que vemos é basicamente a mesma coisa: Frances com algum problema, lidando da pior maneira possível, como se fosse uma pré-adolescente. Talvez a intenção tenha sido essa mesma, a de criticar essa geração de jovens adultos despreparados para o que o mundo lhes reserva, um fenômeno contemporâneo que assume diversas formas em diversas culturas, como os hikikomori no Japão ou os nem-nem no ocidente (jovens que nem trabalham, nem estudam).
Se foi essa a intenção, o resultado foi mais enfadonho do que qualquer outra coisa, já que foca muito nessas situações e pouco tempo reserva para o crescimento da personagem, que fica estagnada a maior parte do filme (e cujo crescimento no final não parece acontecer de maneira muito orgânica). A impressão que fica é que quase tudo o que vemos em Frances Ha é descartável e nada acrescenta à trama ou à personagem, como a (curtíssima) temporada que Frances passa na França ou mesmo grande parte das férias de fim de ano com sua família.
Apesar dos grandes problemas, Frances Ha não é de todo ruim. Gerwig faz uma ótima atuação e é só por causa dela que o filme se torna minimamente assistível: sua personagem, apesar da infantilidade e falta de maturidade, é charmosa e além disso, consegue nos inspirar confiança de que nem toda esperança está perdida. Mesmo com suas loucuras e trapalhadas, conseguimos nos identificar um pouco com ela: afinal, a vida adulta não é nada fácil e quem não deixa escapar um pouco de infantilidade de vez em quando (como Frances faz ao mentir como forma de proteger o orgulho, por exemplo)?
Frances Ha tem alguns bons diálogos e boas cenas pontuais, como o arco do relacionamento de Frances e Sophie (o melhor do filme, que é deixado de lado por quase metade do filme no seu meio), especialmente numa das cenas finais, que evoca um diálogo sobre relacionamentos perfeitos feito num jantar anterior a ida à França, ou algumas das cenas iniciais, que mostram Frances correndo pelas ruas de Nova York. Infelizmente, o saldo do filme ainda é negativo. A falta de desenvolvimento da trama e da personagem, com situações descartáveis, deixa o ritmo lento e enfadonho. Uma pena, já que o filme toca em temas interessantes, como a adolescência estendida e os diferentes tipos de amores e relacionamentos. E nem todo o charme de Gerwig salva Frances Ha.
Trailer:
Para saber mais: crítica no AdoroCinema e no blog do Rubens Ewald Filho.
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