Modelos, lindas e amputadas

Beleza em si é um conceito difícil, e na maioria das vezes acaba caindo em preferências pessoais. Cientistas tendem a medir a beleza pela simetria, tanto de uma equação (sério, já ouvi físicos dizerem isso!) quanto de um rosto. Mas o ser humano, como um ser complexo e todo fodido, tem outras infinitas medidas de beleza.

O site Ampworld.de tem como proposta mostrar fotos de modelos amputadas. Por causa de algum acidente, por um defeito congênito, não importa a causa, o que todas elas têm em comum é exatamente não ter pelo menos uma parte de um membro.

O site serve de ponto de encontro para fetichistas (sim, existe um nome pra isso, é acrotomofilia), mas também como ponto de encontro para aqueles que não têm frescura de observar a beleza em suas diferentes formas.

Além disso, o site serve como um ponto de discussão sobre os amputados e o papel que a sociedade os impõe, nem sempre "humano". Essa bandeira é levantada pelo criador do site, que recentemente deu uma entrevista para a revista Vice Magazine.

(Emma, alemã, 19, teve a perna amputada devido a uma infecção. E não, a foto não foi tratada por algum estagiário usando Photoshop, que nem os caras da Playboy que apagam umbigos.)

Além dessa matéria na revista, foi tema de discussão em alguns blogs americanos que eu acompanho, "de putaria", como eu os carinhosamente chamo, o Fleshbot, que defende que "se uma mulher é gostosa, perder um braço não vai fazê-la menos gostosa", e o Sexoteric Blog, que indicou a entrevista na Vice Magazine.

Abaixo, selecionei alguns trechos da entrevista com Markus, o idealizador do site (traduzidos por este que vos fala).

Oi Markus. Parece que você é o coração atrás do Ampworld. Quem é o cérebro?

O website é criação da minha esposa, que perdeu a perna esquerda dela, até acima o joelho, depois de um trágico acidente de trânsito. Desde que ela era criança, minha esposa sonhava em se tornar uma modelo profissional. Entretanto, a revelação veio quando ela entrou numa competição de modelos alguns anos atrás. Sentindo vergonha da sua condição física, ela escondeu o fato que estava usando uma prótese na perna. Foi apenas durante a última etapa do concurso que os juízes descobriram a perna artificial. Minha esposa foi desqualificada na hora.

Em última análise, esta dura experiência foi a força motriz para criar o website para ajudar pessoas com deficiências físicas a trabalharem como modelos profissionais. Ampworld também pretende encorajar pessoas com deficiências, tenta aumentar as esperanças e dar a essas pessoas otimismo, para ajudá-las a superar os preconceitos e vieses que existem contra todas as pessoas com deficiências físicas no mundo, hoje.

(Cindia, austríaca, 24, amputação de ambas as pernas, acima e abaixo do joelho. Gatinha mesmo assim.)

De onde exatamente as más vibrações se originam?

Desde que o nosso website entrou em operação, apenas dois artigos negativos apareceram na imprensa, e ambos na Romênia. Parece que a discriminação contra pessoas com deficiências, nos países da Europa oriental, é ainda muito grande. Jornais dizem a seus leitores que amputados não deveriam aparecer em público e nós sabemos pela nossa experiência, que pessoas com deficiências sentem muita vergonha em participar de qualquer atividade que atraia atenção de qualquer maneira. Um comentário num jornal até disse que deveríamos trazer Adolf Hitler de volta e matar todos os deficientes. Esses são pontos de vista extremos e ultraconservadores, e deve ser feito todo o possível para contra-atacar esse tipo de atitude. Nós condenamos comentários como esses, nos termos mais fortes possíveis.

Trolls existem em todos os lugares.

(Kelly, britânica, 24, nasceu sem o braço do cotovelo pra baixo. Tem toda a pinta de femme fatale.)

O que pode ser feito pra tudo melhorar?

Inevitavelmente, não podemos mudar todos esses antigos e persistentes estereótipos, intolerâncias e problemas de desigualdade em muitos países, da noite para o dia. Entretanto, acreditamos fortemente que cada pequeno sucesso ajuda a aumentar o otimismo daqueles engajados nisso, e transmite a importante mensagem que ninguém neste planeta deveria ser coagido a se sentir inferior, simplesmente por causa de alguma deficiência física.

(Aurelia, alemã, 26, perdeu a perna esquerda num acidente de moto. Tem jeito de alemã brava, ;) mas nem por isso, menos gostosa.)

Até onde percebi, suas modelos nunca estão nuas, mas elas estão frequentemente vestidas de maneira sexy e parecem provocantes. Como?

Por que esta pergunta deveria ter surgido? Por que pessoas deficientes não deveriam ser sexy? Nosso objetivo é demonstrar que, primeiro, beleza e deficiência não são coisas contraditórias. Segundo, deficientes são tão felizes e têm a mesma qualidade e padrão de vida quanto suas contrapartes com o corpo padrão. Terceiro, trabalhar como modelo profissional é possível. E por último, mas não menos importante: não há razão para se esconder do mundo por causa de uma deficiência física.

(Tereza, de Praga, 19, perdeu parte de baixo da perna num acidente. Com certeza tem toda a beleza das modelos da Europa oriental. Com o perdão da palavra, eu achei super gostosa.)

Eu entendo que você queira mostrar amputados como seres humanos que são sexy, apesar das suas desvantagens. O que você diria se alguém por acaso começasse um website similar ao seu, mas ao invés com modelos com, por exemplo, perda de glóbulos oculares ou talvez alguma espécie de doença que consumisse a carne/pele?

Fantástico! Eu acho que essa é uma grande idéia! Por que não? Todo mundo, seja homem ou mulher, deficiente ou não, tem uma beleza especial. Existe muito mais em um ser humano do que a perfeição física. Sociedade e mídia têm nos condicionadoa definir beleza como perfeição física. Em alguns casos essa definição de beleza tem formas bizarras. Algumas top models parecem anoréxicas e são francamente, esqueletos ambulantes. Algo como menos de 1% da população alcançaria esse critério de beleza, e o resto da população deveria se sentir inferior sendo ou muito gordos, ou muito baixos ou usando óculos?

Olha só, eu sou gordo, baixo e uso óculos. LOL. \o/ Huahuahua!

(Fanni, húngara, 18 aninhos, nasceu sem ambas as pernas da coxa pra baixo, e sem alguns dedos. Apesar disso, é linda. Uma das minhas preferidas!)

O que inspira as fotos?

Ao contrário das grandes revistas de moda, nós queremos combinar moda e beleza com naturalidade. Nossas fotos não são manipuladas com Photoshop ou qualquer outro programa de computador. Elas são o que a câmera vê. Nós queremos mostrar a verdadeira beleza de nossas modelos e não um mundo de ilusão. Além disso, um dos nossos principais objetivos é ajudar algumas de nossas modelos que passam por necessidades, e já ajudamos mais de dez de nossas modelos providenciando próteses. E isso tem as ajudado de maneira enorme a voltar a ter uma vida normal. Geralmente vemos que nossas fotos mudam a personalidade de algumas de nossas modelos. Jovens mulheres particularmente, se sentem envergonhadas das deficiências, e sofrem por causa disso. Com as sessões de foto, temos melhorado a autoconfiança delas, e ajudado a fazer com que se vejam de maneira diferente.

(Debbie, holandesa, 22, perdeu o braço num acidente. Bonita, participou do Britain’s Missing Top Model.)

Eu só ouvi falar de concursos de beleza para amputadas como o Britain's Top Missing Model, mas quais outros tipos de trabalho uma modelo amputada pode conseguir esses dias?

O negócio de modelos é muito competitivo. O que é particularmente ruim é que grandes fornecedores ortopédicos preferem usar modelos normais em suas propagandas de cadeiras de roda. Parece que pra eles, faz mais sentido do que usar uma modelo com alguma deficiência que está realmente numa cadeira de rodas.

Certas coisas não têm lógica mesmo. Isso se chama humanidade.

(Luna, polonesa, 24, perdeu a perna esquerda acima do joelho, amputada num acidente. Não deixou de ser linda! Ela e a Fanni disputam a minha preferência!)

A entrevista completa com o Markus, criador do Ampworld.de (que está num português meio sofrível, mas entendível), pela repórter Constance Goldmann, se encontra aqui na Vice Magazine (em inglês).

E só pra deixar registrado, concordo com o que foi dito no Fleshbot. E não sou nenhum expert em fetiches (como a B. do A Vida Secreta :) hehehe), mas não vejo nada demais neste fetiche. Apesar de não me considerar um acrotomófilo porque não excito SÓ porque a mulher não tem parte do corpo.

(Andy, britânico, 32, perdeu a perna num acidente. Pra mulherada que reclama que eu só coloco foto de mulher, aqui vai o único modelo masculino do site. Quem se amarra num Lex Luthor, deve gostar. Da minha parte, eu tenho preconceito contra os portadores do cromossomo Y.)