Uma história de amor. Diferente e única (como todas são, aliás). O filme Laurence Anyways num primeiro momento parece nos trazer uma história inusitada, mas que na essência, acaba se revelando uma (boa) história de amor.
Laurence Anyways nos mostra um pouco mais de uma década do relacionamento entre Laurence Alia (Melvil Poupaud), um professor e escritor que parece ter uma boa carreira a frente, e Fred Belair (Suzanne Clément), uma moça de estilo aberto e alternativo que trabalha com cinema, na produção de filmes. O casal vive um romance feliz e alegre, com ares adolescente, com muitos risos, cigarros e sexo no carro em dias chuvosos. O desenrolar do filme começa em 1989, logo depois de Laurence ganhar um prêmio local. Não aguentando mais esconder quem é, ele revela a Fred que é transexual e pretende começar a viver de acordo, usando vestidos e outras roupas femininas, e depois, a tomar hormônios para deixar o corpo condizente com a sua alma. Obviamente, ela a princípio não aceita bem, mas em nome do amor, permanece com ele. Até quando e até onde, é o que descobriremos no filme.
Antes de ser sobre identidade/orientação sexual, Laurence Anyways é um filme sobre um relacionamento. A questão da troca de gênero de Laurence, de homem para mulher, obviamente tem o seu peso e o seu espaço durante o filme, mas essas situações não são tão exploradas quanto a dinâmica do relacionamento entre Laurence e Fred. De fato, as situações envolvendo a transexualidade de Laurence são até óbvias e pouco inspiradas, às vezes caindo em clichês, como a perda do emprego devido ao preconceito da "alta cúpula" sem rosto, ou a os machucados resultantes de uma briga devido a homofobia.
O cerne de Laurence Anyways é realmente o relacionamento entre Laurence e Fred. O diretor e roteirista Xavier Dolan, gay assumido e que já produziu dois outros filmes envolvendo fortemente aspectos da sexualidade (Eu Matei a Minha Mãe e Amores Imaginários), acompanha de perto a vida dos personagens, de maneira quase documental. Isso se traduz em frequentemente filmar os personagens de costas, seguindo-os por cima do ombro. Além disso, nas cenas de brigas (que casal não as tem?), Dolan abusa dos closes nos rostos e das tomadas mais longas, com menos cortes (não cortando para o rosto do personagem que fala no momento), valorizando a atuação dos atores. Atuação esta que merece destaque. Se Melvil Poupaud se apresenta bem como protagonista, Suzanne Clément se entrega de alma e corpo (quase que literalmente) a sua Fred.
Com uma trilha sonora excelente, que vai desde músicas populares das épocas que o filme passa, incluindo Duran Duran e Celine Dion, até músicas clássicas de Beethoven e Tchaikovsky, Laurence Anyways tem um ritmo lento e intimista. Infelizmente, o ritmo parece ser o seu maior problema. Com cerca de duas horas e quarenta minutos de projeção, o filme se torna um pouco cansativo no seu terço final.
SPOILER ATÉ O FINAL DO PARÁGRAFO. Apesar do último terço do filme ser prejudicado pela duração, que torna-o um pouco cansativo, Laurence Anyways tem um final genial. Aliás, dois finais. O primeiro final, que mostra o último encontro do casal, já há muito separado, num bar, e depois a fuga de cada um deles sem o outro saber, pela porta da frente e pelos fundos, decidindo (dolorosamente) deixar o passado feliz onde ele está (no passado) e indo em direção ao futuro, reconhecendo o que tiveram e aceitando que tudo muda, pode não ser romântico estilo água com açúcar, mas é romanticamente real. E para quem gosta de um final mais emotivo, Dolan ainda coloca um segundo final, que apesar de clichê (é a mesma ideia da última sequência de Um Dia, por exemplo), é eficiente. Neste final, ele mostra um flashback de como o casal se conheceu e o primeiro flerte deles, com Laurence convidando Fred para sair, voltando ao começo de tudo.
Laurence Anyways é um bom filme de drama e romance, tendo como fundo a transformação de Laurence de homem para mulher. Ao contrário do que é vendido no trailer, o filme não é sobre um transexual, mas sobre o relacionamento de duas pessoas. Que, por si só, já teria drama de sobra. Como toda boa história de amor.
Trailer:
Para saber mais: site oficial do filme (em francês) e críticas no Adoro Cinema e no Blog do Rubens Ewald Filho.
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